Sou filha de João e Cléa. Mãe de Clara. De meus antepassados herdei o ímpeto da luta, e do desejo de justiça. Também o gosto pelo sonho. E pela imaginação. Minha mãe começou a trabalhar com 11 anos, primeira da família a ingressar na universidade, tornou-se advogada criminalista. Depois, foi presa política na ditadura civil-militar brasileira. Esposa do deputado no segundo mandato, que já se encontrava cassado e preso pelo AI-5. Cléa estava grávida de seis meses de mim quando foi presa. Apesar de tudo isso, nasci grande, numa manhã bem cedo, em maio de 1969.
Sempre escrevi no lusco fusco matinal, quando até os ruídos dos pássaros me parecem letras. Esse ritual começou lá pelos seis anos, com versos que falavam do amor e da morte. Minha formação inicial foi em psicologia. Estudei psicanálise e filosofia. Fiz meu mestrado e doutorado em literatura porque queria escrever. Me tornei Professora Universitária, dei aula em Salamanca em 2000, na PUC-Rio de 2005 até hoje, na UFF desde 2021. Fui membra do Colégio Internacional de Filosofia em Paris por seis anos, onde lecionei uma vez por ano. Dou muitas aulas também na Argentina, em Portugal e em diferentes universidades do Brasil. Tenho livros de poemas e romance publicados, outros a caminho. Diferentes livros de ensaios, em parceria ou sozinha, outros ainda estão por vir. Além de inúmeros artigos espalhados em revistas ou livros, alguns esgotados.
A questão de minha vida sempre foi entender a alma do corpo: emoções e afetos, memórias e esquecimentos, traumas e experiências limite que marcam os corpos, como uma escrita feita de ferro e fogo, sem que muitas vezes a gente consiga ler, entender ou decifrar.
Por isso minhas pesquisas, que partiram do corpo, buscaram sempre percorrer lugares a ele constelares. Debrucei-me sobre a obra de um dos maiores escritores do corpo do século XX, Antonin Artaud. Daí, publiquei livros, artigos e traduzi para o português inúmeros de seus textos. A desrazão, a loucura e ‘o fora de si’ também fizeram parte dessa longa investigação sobre os corpos em sofrimento. Logo, a fome e sua (im)possibilidade de se escrever. A precariedade desses estados e vidas me levou a pensar numa noção (inexistente no meio crítico e literário) de escrita de caderno. Me debrucei sobre cadernos de artistas, escritores, transeuntes, mães e pais de santo, como lugares de uma escrita limite, que por um lado questionam o regime letrado, e por outro instauram o trânsito e a relação entre os corpos e a escrita, a arte e a literatura, o texto e o desenho, a eficácia da palavra e o corpo, a magia e a escrita.
Mais recentemente, me dediquei a pensar o regime dos afetos fora do âmbito privado, em sua inscrição publica. Minhas pesquisas até aqui fizeram-me perceber que as transformações do mundo não passarão exclusivamente pela compreensão de seus fenômenos, mas pela alteração do horizonte de uma sensibilidade comum. Não por acaso os afetos se tornam hoje a cena de um fogo cruzado da política. Foi na trilha dos afetos que me dediquei a repensar a noção de Relação, do escritor da Martinica, Edouard Glissant. De 2019 a 2020 pesquisei seus escritos, cartas e cadernos na Biblioteca Nacional Francesa, com uma bolsa CAPES de Professora Visitante Sênior em Paris 7. Com o meu retorno, fui convidada pela 34ª Bienal de Arte de São Paulo, onde propus e realizei o enunciado “Corte/ Relação em Édouard Glissant e Antonin Artaud”, uma exposição de cadernos de Artaud e de Glissant. A revisão de diversos arquivos instituídos, através de releituras expositivas, com ênfase na revelação de diferentes cadernos da cultura é meu desejo e guia, calcado na convicção de que devemos concreta e simbolicamente reescrever a nossa história.
Em função de todo esse caminho, entendi que minha trajetória nunca foi exclusivamente crítica. E decidi, com a bolsa de Cientista do Estado da FAPERJ – 2019, reunir e repensar os eixos crítico e artísticos sob a égide de uma clínica da cultura. Que agora, este site, busca reunir e propagar.
Este site, construído com muito carinho para com os leitores e leitoras, reúne textos, vídeos e fotos dos marcadores ou eixos disso que agora reúno e repenso como sendo os traços de um exercício clínico da cultura.
Muitos desses textos, ensaios e artigos dispersos ou esgotados podem ser lidos aqui, divididos nas etapas históricas da pesquisa crítica até a sua formulação clínica. São eles: Corpo, Fome, Sobre Artaud, Arquivos, Cadernos e Cartas e Dos Afetos à Crítica Clínica da Cultura.
Além desse material textual e imagético, disponibilizo uma seção Em ação em torno dos processos de criação, onde além dos textos publicados irei, eventualmente, inserir ‘pílulas’ acerca dos meus (e de outros) processos de criação.
Ao fim, o mais importante: a seção Entre Nós, onde peço a quem me visita que interaja com minhas propostas, lugar futuro, para mim, de parcerias vindouras.